capa-blog

A eleição de Tancredo Neves

e os comícios paulistanos pelas Diretas Já

Tancredo, ao centro, comemora a eleição para presidente em 15 de janeiro de 1985.

 

Há 38 anos, no dia 15 de janeiro de 1985, Tancredo de Almeida Neves era eleito o primeiro presidente civil do Brasil após o período da ditadura militar,  ainda por meio de eleição indireta. Ainda assim, os comícios realizados por todo o país no ano anterior, em prol de eleições diretas, que terminaram com a então maior manifestação popular da história, em São Paulo, foram determinantes para o apoio à eleição do novo presidente.

Em 15 de janeiro de 1985, no Congresso Nacional, em Brasília, um  “Colégio Eleitoral” formado por deputados federais, senadores e delegados de cada Assembleia Legislativa dos Estados Brasileiros, se reunia para decidir o futuro da nação.

Ali, escolheriam, entre dois candidatos, Paulo Salim Maluf e Tancredo de Almeida Neves, o novo Presidente da República. Maluf representava as forças ligadas ao regime militar, concorrendo ao pleito como representante do antigo Arena, partido político formado para dar sustentação ao regime militar.

Tancredo Neves, foi escolhido representante do Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, que uniu as forças sociais progressistas da sociedade.

O Brasil vivia os momentos finais da ditadura, quando se esperaria, no mínimo, uma disputa equilibrada. Porém, a vitória de Tancredo foi incontestável. Recebeu 480 votos (72,7%) contra 180 dados a Maluf (27,3%), vindo a se tornar o primeiro presidente civil após o período ditatorial.

Mas, a história da vitória nesta eleição de 15 de janeiro de 1985, remonta a muito antes daquela tarde, e os dias que se sucederam a partir desta eleição, marcariam o Brasil.

É extensa a lista de fatores que culminaram na vitória de Tancredo. Coisa para analistas políticos. Mas, é indubitável que a sociedade brasileira havia perdido o medo das armas e da repressão das forças militares.

Algo que começou com o ato de bravura desafiadora de Dom Paulo Evaristo Arns, Henri Sobel e Jaime Wright, religiosos que desafiaram o regime no culto ecumênico que reuniu mais de 8.000 pessoas na Catedral da Sé, em memória à Wladimir Herzog, assassinado dias antes, no ano de 1974, e culminou no movimento Diretas Já, uma movimentação da sociedade em prol de eleições diretas, que teve o seu primeiro comício realizado em 1983.

As Diretas Já. Um recado à classe política.
O primeiro comício pelas Diretas na capital, em novembro de 1983, reuniu pouco mais de 4.000 pessoas.

A ideia de criar um movimento a favor de eleições diretas foi lançada em 1983, pelo então senador alagoano Teotônio Vilela no programa Canal Livre da Rede Bandeirantes. A primeira manifestação pública ocorreu no recém-emancipado município de Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife, em Pernambuco, no dia 31 de março de 1983. Foi seguida por manifestações em Goiânia, em 15 de junho de 1983 e em Curitiba em novembro do mesmo ano.

Em 27 de novembro de 1983 na cidade de São Paulo, ocorreu o primeiro comício, na Praça Charles Miller, em frente ao Estádio do Pacaembu, reunindo pouco mais de 4.000 pessoas.

O movimento cresceu e foi tomando corpo com comícios por todo o Brasil, em 1984,  até que no dia 16 de abril daquele ano, a cidade de São Paulo assistiu à maior movimentação popular de sua história. Um milhão e quinhentas mil pessoas estiveram no último grande comício, realizado no Vale do Anhangabaú.

O último comício, em abril de 1984, teve a participação de um milhão e quinhentas mil pessoas.

Em 25 de abril de 1984, sob grande expectativa dos brasileiros, a emenda das eleições diretas foi votada no congresso, obtendo 298 votos a favor, 65 contra e 3 abstenções, o que teria dado vitória ao movimento popular.

Mas, devido a uma manobra de políticos aliados ao regime militar, não compareceram 112 deputados ao plenário da Câmara no dia da votação e a emenda foi rejeitada por não alcançar o número mínimo de votantes para a sua aprovação. A manobra da classe política, enterrava a vontade popular.

A derrota da Emenda Dante de Oliveira foi um balde de água fria derrubado sob a sociedade, que não iria poder votar pela primeira vez para presidente. Ao contrário, a votação fora delegada ao Colégio Eleitoral já citado.

Mas o recado das ruas era inequívoco. A sociedade queria mudanças. Os deputados atentos ao Brasil real, seja por convicção ou por conveniência política, entenderam o recado, dando ampla vitória a Tancredo, eleito, então, presidente.

Dias de angústia e frustração.
Tancredo com os médicos em Brasília.

Tancredo Neves, que já contava 75 anos,  havia se submetido a uma agenda de campanha bastante extenuante, articulando apoios do Congresso Nacional e dos governadores estaduais em deslocamentos pelo Brasil e mesmo viajando ao exterior na qualidade de presidente da República eleito.

Tancredo vinha sofrendo de fortes dores abdominais durante os dias que antecederam a posse, marcada para o dia 15 de março de 1985. Aconselhado por médicos a procurar tratamento, teria dito: “Façam de mim o que quiserem – depois da posse”.

O temor de Tancredo era que os militares da chamada “linha-dura” se recusassem a passar o poder ao vice-presidente, caso fosse internado. Decidiu então  só anunciar sua condição e saúde no dia da posse, 15 de março, quando já estivessem em Brasília os chefes de Estado esperados para a cerimônia. Assim ficaria mais difícil uma ruptura política, com o mundo “assistindo” a transição em Brasília. 

Jornal O Globo traz a notícia que o Brasil não queria ter.

Mas, na noite de 14 de março, durante uma cerimônia religiosa no Santuário Dom Bosco, em Brasília, já na véspera da posse, Tancredo sentiu-se mal e foi internado às pressas no Hospital de Base do Distrito Federal.

Eu seu lugar, assumiu interinamente a Presidência do Brasil, até o restabelecimento de Tancredo, seu vice, José Sarney. 

Os dias que se seguiram foram de angústia e “pararam” o país. Não se falava em outra coisa naquele momento.

Em 26 de março Tancredo foi transferido para o Hospital das Clínicas de São Paulo. Um dia antes da transferência, foram divulgadas fotos suas no hospital, que deram a impressão de que ele estava melhorando, mas horas veio à tona a notícia de que Tancredo mas verdade, estava com uma grave hemorragia.

Durante todo o período em que ficou internado, Tancredo sofreu sete cirurgias, não resistiu a tantas intervenções e faleceu em 21 de abril, aos 75 anos, sem assumir a presidência da República.

A morte foi anunciada à população pelo então porta-voz oficial da presidência Antônio Britto: “lamento informar que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Tancredo de Almeida Neves, faleceu esta noite no Instituto do Coração, às 10 horas e 23 minutos.

Mais uma vez, São Paulo foi testemunha de um fato histórico de comoção nacional. A capital paulista ainda viria parar suas avenidas para o cortejo fúnebre e cruzar os ares, na manhã do dia seguinte, o avião presidencial que decolou do Aeroporto de Congonhas, rumo à Brasília, com o corpo do primeiro presidente eleito e não empossado, após a redemocratização do país.

Tancredo foi velado no Senado Federal e enterrado em São João del-Rei, sua cidade natal, em Minas Gerais.

O cortejo fúnebre de Tancredo parou a cidade de São Paulo.

Arquivo: