A história da fundação
da Igreja Armênia
na capital paulista
No próximo dia 21 de janeiro é celebrado, no Brasil o Dia Nacional do Combate à Intolerância Religiosa, estabelecido pela Lei 11.635/2007, de autoria do então deputado federal Daniel Almeida.
A data foi escolhida em homenagem ao falecimento da ialorixá (mãe de santo) baiana Mãe Gilda, que foi acometida por um infarto após a invasão de sua propriedade e a tentativa dos invasores de “exorcizá-la” por conta de sua religião, fato acontecido em um 21 de janeiro.
Desde que a humanidade percebeu a consciência, o “desconhecido” passou a inquietar a existência humana e as religiões tem a capacidade de reunir grupos com crenças semelhantes. Inúmeras são as religiões.
As de matrizes africanas, como a Umbanda r o Camdomblé, as do oriente, como o Budismo e o Hinduísmo, as originadas no oriente médio, como o Judaísmo, o Islamismo e as inúmeras vertentes do Cristianismo, como o Catolicismo, o Protestantismo e a Ortodoxia.
Para o mal e para o bem
As religiões representam o grupamento de partes da humanidade que se identificam com as suas filosofias, os seus dogmas, seus ensinamentos, seus ritos e seus códigos de vestimenta, conduta e prática.
Essencialmente as religiões buscam aproximar o ser humano do “divino”, pregando em sua maioria, comportamentos individuais e coletivos que busquem conceitos como fraternidade, irmandade, caridade, empatia, amor a si e ao próximo. Comportamentos estes que “aprimoram” as virtudes dos seres, os preparando para este encontro com o “divino”.
Mas não se pode deixar de lembrar que, em nome das religiões, muitas atrocidades já foram e são cometidas contra aqueles que são nossos irmãos de espécie. Somos todos seres humanos, independente de nossa origem geográfica.
Quantas guerras, mortes e sofrimento já foram causados em “nome” da religião? A história nos mostra centenas.
A despeito das motivações políticas e econômicas destas guerras, que usam a religião como indutora, há também e justamente, a intolerância religiosa.
Se temos uma crença, tendemos a achar que ela é a unica e a verdadeira. Mas atacar o nosso semelhante apenas pela prática de uma outra crença, uma outra religião é prática que merece reflexão. Daí a importância deste Dia Nacional do Combate à Intolerância Religiosa.
O papel de Rizkallah Jorge na construção de uma Igreja Armênia em São Paulo
Como já dissemos anteriormente, nosso fundador Rizkallah Jorge Tahan nasceu na Síria, mas descendia de armênios. Os Armênios foram o primeiro povo a adotar o cristianismo como religião, Em 301, a Armênia tornou-se a primeira nação do mundo a se tornar oficialmente cristã.
Essa herança religiosa de Rizkallah Jorge o tornara profundamente católico, uma fé que o acompanhou quando decidiu se mudar da Síria e vir tentar a sorte na América.
Rizkallah Jorge chega ao Brasil em 1895, monta a sua empresa três anos depois e tem um grande sucesso empresarial nas terras paulistanas.
Nos primeiros anos do Séc. XX Rizkallah Jorge já era um dos maiores empresários de São Paulo.
À medida que ele começava a se estruturar financeiramente, Rizkallah Jorge mostra o seu caráter benemérito, ajudando centenas de imigrantes sírios e armênios que chegavam ao Brasil, particularmente em São Paulo.
Rizkallah montou em um dos imóveis que possuía na rua Florêncio de Abreu, uma espécie de hospedaria, onde recebia os imigrantes e os alojava até que conseguissem uma ocupação e renda.
Essa proximidade com os conterrâneos sírios e os imigrantes armênios era tão grande que é aceito pela comunidade armênia em São Paulo, que a primeira missa da Igreja Armênia na cidade foi realizada no interior de um imóvel de Rizkallah Jorge na rua Florêncio de Abreu. Não se sabe ao certo se o mesmo em que ele abrigava temporariamente os imigrantes.
A decisão de construir uma igreja
Os anos foram passando, Rizkallah Jorge tendo sucesso em seu negócio e sendo cada vez mais uma pessoa influente na cidade. Ao mesmo tempo a colônia armênia crescia em São Paulo e os anseios por terem uma igreja cresciam da mesma forma.
Os armênios são cristãos ortodoxos, seguem uma vertente do cristianismo que rompeu com a vertente Apostólica Romana. Denominam-se apostólicos pois a Igreja foi fundada por dois apóstolos de Jesus: Tadeu e Bartolomeu.
Mas com a cisão da vertente Romana, não tem o Papa como seu representante maior, e sim o Supremo Líder, atualmente Sua Santidade, Karekin II. A sede mundial da Igreja Armênia fica na cidade de Vagharshapat, Armênia.
Participando ativamente das iniciativas que visavam a instalação de uma igreja armênia na capital, Rizkallah decide encabeçar o ousado projeto e doa um terreno de sua propriedade na avenida Senador Queiroz para ser o local onde a igreja seria construída.
Não apenas o terreno Rizkallah doou, mas também o dinheiro necessário à construção do templo religioso.
Assim foi que no dia 21 de março de 1937, um Domingo de Ramos, aconteceu a cerimônia de lançamento da pedra fundamental da igreja, em um evento que mobilizou centenas de pessoas das comunidades armênia e síria da capital paulista.
E assim foi que em pouco mais de um ano a primeira Igreja Apostólica Armênia seria inaugurada em São Paulo. Foi em 10 de abril de 1938, novamente um Domingo de Ramos.
O sonho dura apenas cinco anos
A felicidade da comunidade, infelizmente, em pouco tempo deu lugar a uma enorme preocupação e depois a uma certeza angustiante. A igreja há pouco construída seria demolida em breve.
A prefeitura de São Paulo decidira fazer o alargamento da Av. Senador Queiroz e, para isso, iria desapropriar vários imóveis, dentre eles o da Igreja Armênia.
Assim, no dia 2 de maio de 1943, era celebrada a última missa na Igreja Apostólica Armênia da Av. Senador Queiroz. No dia seguinte, começaram os trabalhos de desocupação e a posterior demolição da edificação de apenas cinco anos de construção.
Muito abatido, Rizkallah Jorge sentira um impacto muito grande em ver o empenho que tinha pessoalmente feito, junto com a comunidade, para a construção daquele templo.
Demorou bons meses até que o seu ímpeto de realizador se fizesse novamente presente e Rizkallah Jorge decidisse “construir uma nova Igreja” *. A partir desse momento, novamente o empresário se empenhou em achar um terreno adequado para que pudesse construir um novo templo para a comunidade armênia.
Uma nova igreja será construída
Em 31 de maio de 1944 Rizkallah anunciava ao Conselho Administrativo Central que havia adquirido um terreno na Avenida Tiradentes, que às suas custas ergueria a nova Igreja e que, quando pronta, doaria terreno e a igreja à comunidade armênia, com o compromisso que a comunidade construísse, posteriormente, as demais edificações (a secretaria e uma escola).
Em 25 de março de 1945, mais uma vez um Domingo de Ramos, acontecia a missa que marcou a colocação das pedras fundamentais da nova igreja, que seria, finalmente, inaugurada no dia 3 de abril de 1949.
A Catedral Armênia São Jorge fica na Av. Santos Dumont, 55, a estação Armênia do Metrô, que, não por acaso, tem este nome, em razão da Igreja erguida por Rizkallah Jorge e em homenagem à comunidade armênia que passou a frequentar a região.
* As informações deste texto foram extraídas o livro “A Coletividade Armênia do Brasil, de autoria do Padre Yeznig Vartanian. Editora Labrador, 2020.
Originalmente publicado na década de 1940, em Armênio, o livro foi traduzido para o português por Yervant Tamdjian e a edição de 2020 foi coordenada pelo Prof. Dr. Hagop Kechichian.