capa-blog

A história do Réveillon

e as tradições brasileiras da virada do ano

As primeiras comemorações de Ano-Novo que se tem registro datam de 4000 anos atrás. Aconteciam na Mesopotâmia e eram a celebração do fim do inverno e início da primavera, o que acontecia entre os dias 22 e 23 de março do nosso calendário atual.

Essa celebração simbolizava o início de uma nova safra de plantação e era o momento em que as pessoas pediam por alimentos e fartura para o ano.

Para os persas, assírios, egípcios e fenícios, o novo ano era celebrado em setembro e para os gregos em dezembro.

Os romanos foram os primeiros a estabelecer uma data no calendário para essa comemoração. A princípio, o ano novo romano era comemorado em 1º de março, mas em 153 a.C, estabeleceu-se a data de 1º de janeiro.

Em 46 a.C, os romanos adotaram o calendário juliano e mantiveram essa data. 

Bem mais recentemente (em termos históricos, claro), em 1582, com a adoção do calendário gregoriano (que utilizamos atualmente) pela Igreja Católica, a data de 1º de janeiro foi oficialmente estabelecida.

O calendário é baseado no movimento da Terra em torno do Sol, desse modo ajusta-se com os eventos astronômicos, como o equinócio de primavera e o solstício de inverno. 

Possui os famosos 365 dias, divididos em 12 meses. Mas, na verdade a volta da Terra em torno do Sol leva 365 dias e seis horas. Para descomplicar a coisa, estabeleceu-se que estas seis horas seriam acrescidas em um dia de fevereiro a cada quatro anos. Esse dia a mais ocorre nos anos bissextos  e o próximo será em 2024, quando fevereiro terá 29 dias.

A passagem para o novo ano, no entanto, ainda é celebrada em datas diferentes por alguns povos e religiões, como para os muçulmanos, por exemplo, que comemoram em maio, e os judeus, cuja passagem do ano é comemorada no final de setembro, e os chineses, cujo ano novo se inicia em fevereiro.

Como se vê a data tem muito mais um significado simbólico, de rito de passagem, do que, necessariamente, um dia unânime.

Assim como este rito de passagem tem uma data peculiar dependendo da cultura ou religião, da mesma forma são as suas comemorações, que assumem características particulares ao redor do mundo.

No Brasil, inúmeras são as tradições do Réveillon. Aliás, aqui, um pequeno parênteses…

A palavra Réveillon tem origem no verbo em francês réveiller, que significa “acordar” ou “reanimar”. Logo a palavra foi adotada com sentido de “despertar” do novo ano. No seu país de origem, essa palavra era usada para descrever uma refeição leve que era feita à noite e que impedia que as pessoas dormissem.

A partir do século XVII, o termo Réveillon passou a ser utilizado para fazer referência às festas realizadas pela nobreza francesa, que duravam a noite toda. Tempos depois, as nobrezas de outros países adotaram o mesmo nome para as suas festas e o termo se popularizou a partir de então, descrevendo este período que marca o fim de um ano e o início de outro.

Agora, voltando às tradições brasileiras de Réveillon ou Ano-Novo, uma das mais populares é a de vestir-se de branco e para os que estão nas regiões litorâneas, pular 7 ondas no mar.

Essa simpatia está ligada à Umbanda e tem como intuito homenagear Iemanjá e invocar sua proteção para o ano que começa.

Vale lembrar que a Umbanda é uma religião brasileira de ancestralidade africana, surgida em 1908. A palavra “umbanda” pertence ao vocabulário quimbundo, de Angola, e quer dizer “arte de curar”.

A figura dos Orixás aparece para os umbandistas como uma energia natural que é acessada pelos espíritos guias (as entidades) e passada por meio desses espíritos às pessoas.

Iemanjá é um destes orixás. Feminino, considerado por muitos a Rainha do Mar. Recebe diferentes nomes, como Inaê, Janaína, Isis, Maria, Mucunã, Princesa do Mar e Dandalunda.

De acordo com a tradição, Iemanjá, através de sua divindade, nos purifica e dá força para vencer os obstáculos que teremos que enfrentar no próximo ano.

Mas, por que pular exatamente sete ondas no Réveillon?

Sete é um número considerado bastante espiritual em várias crenças, além de representar Exu, filho de Iemanjá.

Portanto, quando pula as sete ondas no mar, você invoca os poderes de Iemanjá para abrir caminhos para o próximo ano.

O uso predominante das roupas brancas também tem relação com a Umbanda. O branco é a cor oficial da religião, não só por representar a paz, mas também pelo sentido que possui relacionado aos seus fundamentos. Um deles é que o branco é o resultado da união de todas as cores refletidas, sugerindo assim o que são as premissas da Umbanda: a junção de influências em uma só crença, a união de todos os orixás em um só Deus e de todas as linhas de trabalho em um só objetivo: o da caridade-amor.

As tradições de ano novo no Brasil

Embora o branco seja a vestimenta predominante no ano novo do brasileiro, existe a crença de se associar outras cores a outros “desejos”, “características” ou “benefícios”, por assim dizer:

Branco: paz, pureza e calma;

Prata: novidades, inovação e modernidade;

Dourado: riqueza, sucesso e prosperidade;

Vermelho: paixão, desejo e intensidade;

Amarelo: dinheiro, alegria e extroversão;

Laranja: energia, entusiasmo e coragem;

Rosa: amor, afeto e carinho;

Lilás e roxo: autoconhecimento, desenvolvimento espiritual e intuição;

Verde: saúde, esperança e boa sorte;

Azul: harmonia, honestidade e confiança;

Preto: independência, autoridade e tomada de decisões.

No alimento da virada, simpatias para um bom ano

Não apenas a vestimenta influencia em um novo ano próspero. A crença popular lista uma série de alimentos que devem ser consumidos na virada do ano para trazer sorte, felicidade, saúde e progresso.

Aliás, aqui, vamos começar por um que, dizem, deve ser evitado: as aves. Sim, nada de frango, galinha, peru, pato, chester… O motivo? Aves ciscam para trás, o que significa atraso de vida!

Vai saber né? Na dúvida, e se puder, evite as penadinhas e abuse de:

Peixe, que traz sorte e fertilidade.

Os peixinhos são animais com uma fertilidade bem aflorada. Cada um coloca uma infinidade de ovos. Já para os cristãos, foi o alimento que Cristo multiplicou. 

Carne de porco: fartura para agradecer

Assim como o peixe que não nada para trás, o porco é visto como um animal que fuça apenas para frente. Por isso, vale consumir na ceia de ano novo. Ele simboliza o progresso e a fartura. 

Lentilha: é pura fartura

Muito saborosas, receitas com lentilha também significam fartura. Assim que virar o ano, o indicado é comer uma porção de lentilhas. Seja com arroz,  salada ou cozida na forma de sopa. 

Dizem que o fato de ela aumentar muito de tamanho quando cozida e, ao final, se parecer com uma pequena moeda, ajuda na fartura do ano que chega.

Uva: a rainha do dinheiro.

A uva é uma fruta abundante. Ela traz dinheiro para quem a degusta na virada. Mas para a simpatia funcionar precisa que as regras sejam seguidas à risca:. assim que der meia-noite, coma 12 uvas, mas uma uva a cada batida do relógio, ou a cada novo segundo do novo ano. 

Diz a tradição que cada fruta representa um mês do ano e o sabor dela vai indicar como será o mês. 

Por fim, uma receita especial de ano novo

Esta receita não é exatamente para alimentar o corpo, mas talvez a esperança. Com a receita de quem entende desse negócio de escrever muito mais do que a gente, nos despedimos de 2023, agradecendo a sua atenção, a sua leitura.

Que pratiquemos, todos, a todo dia, a receita de Ano Novo de Carlos Drummond de Andrade:

RECEITA DE ANO NOVO
Carlos Drummond de Andrade
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,

Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;

novo

até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa

fazer lista de boas intenções
}para arquivá-las na gaveta.

Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem

e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.

É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.”

Arquivo: