A Páscoa e os pioneiros
do chocolate em São Paulo
Os cristãos tem a Páscoa como uma das celebrações mais importantes do cristianismo. Diferente do Natal, quando comemoram o nascimento de Jesus Cristo, a Páscoa é o período de reflexão a respeito dos últimos atos de Jesus.
Ela surgiu com base na ressignificação de uma festa realizada pelos judeus desde a Antiguidade: a Pessach “passagem”.
Na narrativa bíblica Exôdo”, capítulo 12, a Páscoa foi instituída como uma ordem de Jeová (Deus) antes da passagem do anjo da morte pelo Egito. Essa foi a décima praga egípsia, e, após a passagem do anjo da morte e da morte dos primogênitos, os hebreus foram libertos da escravidão. Essa tradição consolidou-se entre os judeus.
Com o surgimento do cristianismo, os fiéis adeptos dessa religião deram novo sentido à celebração em homenagem ao sacrifício de Jesus. Assim, os judeus celebram a libertação da escravidão do Egito, e os cristãos, a crucificação e ressurreição de Jesus.
O ovo e o coelho na Páscoa
Uma das teorias mais aceitas sobre a associação do coelho à Páscoa relata que Maria Madalena teria ido ao túmulo de Jesus antes do amanhecer do domingo. Lá chegando, encontrou o sepulcro aberto e um coelho. O roedor, que supostamente teria ficado preso na sepultura, foi o primeiro ser a ver Jesus ressuscitado.
Assim, o coelho teve o privilégio de ser o portador da notícia da ressurreição do Salvador.
O ovo, por sua vez, é considerado símbolo de vida e renascimento e os povos mais antigos já adotavam a prática de dá-los de presente como um desejo simbólico de vida longeva a quem os recebia.
Na idade média este costume consolidado entre os europeus se aprimorou, com várias culturas passando a não apenas presentear com ovos, mas sim com ovos ricamente ornamentados.
Surgia a tradição de delicadas pinturas nas cascas, tão famosas no norte da Europa, como na Polônia, Alemanha e Rússia.
O chocolate entra em cena
Não se tem, exatamente, uma explicação para o hábito de algumas pessoas começarem a retirar gema e clara dos ovos e passar a recheá-los com chocolate. Mas, certamente, a prática foi popularizada na Europa a partir do Séc. XVIII, quando o continente conheceu se aprimorou as técnicas de produção do chocolate a partir do cacau, trazido dos trópicos pelos espanhóis, que colonizaram a região da América onde o cacau era cultivado e o chocolate produzido.
Com o crescimento da era industrial, o surgimento das fábricas de chocolate e o marketing, fica fácil de perceber que era bem mais prático e gostoso presentear com ovos de chocolate do que com os de galinha e o costume se espalhou pelo mundo todo.
O chocolate “inaugura” um bairro em São Paulo
Em 1885, aqui na Rua Florêncio de Abreu, bem próximo à sede da Casa da Bóia, foi instalada a primeira fábrica de Chocolates da Falchi, criada por três irmãos italianos, Panfilio, Emídio e Bernardino Falchi.
Mas as atividades da empresa, tamanho o seu sucesso, exigiram novas instalações rapidamente.
No dia 7 de outubro de 1890, o jornal O Estado de S. Paulo publicava o nascimento da Vila Prudente em uma pequena nota que afirmava: “Nesta capital foi constituída uma empresa que adquiriu terras entre São Caetano e Mooca, com o fim de estabelecer uma vila que terá o nome encima citado nesta notícia (Vila Prudente), em homenagem ao governador do Estado, dr. Prudente de Moraes”.
Mas o que tem isso haver com o chocolate? Foi neste ano que os irmãos Emídio, Panfílio e Bernardino Falchi, com auxílio do financista Serafim Corso, compraram uma gleba de terra e levaram para lá a primeira indústria da região, a sua Fábrica de Chocolates Falchi.
O operariado da fábrica era constituído basicamente de imigrantes italianos, que vieram das regiões da Mooca, Ipiranga e Brás. Além disso, os irmãos promoviam mutirões para construção de moradias operárias no entorno da fábrica, o que fez com que se iniciasse um processo acelerado de povoamento da Vila Prudente.
A fábrica dos Falchi impulsionou o desenvolvimento industrial e comercial da região. No início do século XX, depois da fábrica de chocolates, vieram outras importantes indústrias, como a Cerâmica Vila Prudente, a Indústria de Louças Zappi, a Manufatura de Chapéus Oriente e a Fábrica Paulista de Papel e Papelão. De uma região quase deserta do final do século XIX, a Vila Prudente se transformava em uma grande vila fabril.
Com inspiração da Suiça surge a Lacta
Tudo começa em 1912. O cônsul suíço Achilles Isella, que já residia no país, resolveu criar uma pequena fábrica de chocolates na cidade de São Paulo, no bairro da Vila Mariana. O objetivo era oferecer ao público brasileiro, chocolates com a mesma qualidade e sabor dos chocolates suíços, que são referência mundial até os dias atuais. Dessa forma, nascia a marca Lacta.
Os chocolates da Lacta tiveram uma imensa aceitação dos consumidores, o que levou a marca a se tornar a pioneira na fabricação em larga escala no Brasil. Ao longo dos anos seguintes, essa prestigiada empresa lançaria icônicos e irresistíveis produtos, que marcaram gerações.
O primeiro chocolate crocante da Lacta foi lançado em 1932. Em 1938, a marca lançou o bombom Sonho de Valsa. Já em 1940, o famoso chocolate Diamante Negro e os primeiros ovos de páscoa Lacta.
Em 1942, o icônico chocolate Bis é lançado e dez anos depois, em 1952, o bombom Ouro Branco.
A história de grandes produtos da marca continua no mesmo ano, com o lançamento do primeiro chocolate branco do Brasil, o Laka, bem como as famosas pastilhas de chocolate Confeti.
A marca brasileira teve vários controladores ao longo de sua história até ser vendida para o grupo multinacional Kraft Foods na década de 90.
Da letônia a Kopenhagen
A Kopenhagen é uma das marcas mais conceituadas e sofisticadas de chocolates e doces do país. A
empresa foi criada na década de 1920 por um casal de imigrantes da Letônia, Anna e David Kopenhagen,
que decidiram fabricar e vender marzipan caseiros – doce típico europeu à base de chocolate, no centro de São Paulo, onde vendiam as iguarias diretamente para funcionários e clientes dos bancos europeus no Centro da capital.
Após muita luta, o casal conseguiu abrir a primeira loja na Rua Miguel Couto, centro, em 1928.
O local tinha uma novidade que marcou os olhos das pessoas da época: bonecos, bichinhos e outras
figuras feitas de marzipan eram expostas na vitrine da loja, tanto para decoração, como para venda. O casal logo inaugurou uma segunda loja na mesma rua.
Pouco tempo depois, já em 1930, os empreendedores viram um novo nicho: os ovos de Páscoa, feitos inicialmente em chocolate ao leite e crocante. Além disso, aprenderam que decorar as vitrines de acordo com as festividades, contribuía muito para chamar a atenção dos consumidores.
No começo da década de 40, decidiram adquirir uma fábrica no bairro do Itaim Bibi, com as
tecnologias mais modernas da época. Assim, além do marzipan e dos ovos de páscoa, a empresa
começou a produzir chocolates finos, bombons, balas, biscoitos e, até mesmo, panetones.
Também na década de 40, o negócio foi expandido, chegando ao Rio de Janeiro, então capital federal.
Nesses anos, a Kopenhagen já oferecia produtos tradicionais, como a Língua de Gato, Chumbinho,
Lajotinha e Nhá Benta. Nos anos 50, uma mudança significativa: a empresa adota o atual logotipo, a assinatura de David Kopenhagen.
Os anos 60 foram marcados por novidades: as caixas de bombom com tampas transparentes; a
inauguração da loja no shopping Iguatemi, em 1968; e os coelhos de chocolate com nome de gente
(Lito, Vera e Bastião).
Em 1996 com 100 lojas, a Kopenhagen já era uma das empresas de chocolates mais requintadas do Brasil
e foi vendida para o empresário paulistano Celso Ricardo de Moraes que mudou a fábrica, primeiramente para Barueri e posteriormente para Extrema, em Minas Gerais.
Da Alemanha, a Sönksen
Até a década de 1970, o nome Sönksen era sinônimo de balas e chocolates em São Paulo. Até hoje, muitos paulistanos se lembram das famosas balas de cevada, que tinham a forma de pingos achatados e vinham em latinhas redondas na cor bordô. Havia também balinhas nos sabores tangerina, leite, anis, mel e abacaxi.
A Sönksen fabricava balas de goma, bombons, pães-de-mel e chocolates. Os primeiros ovos e coelhos de Páscoa, e Papais Noéis de chocolate foram fabricados por eles. “Chocolate para famílias” era o slogan estampado nas embalagens.
A empresa, que recebeu o sobrenome da família paulistana de origem alemã Sönksen, curiosamente não surgiu nem terminou nas mãos de membros do clã. Em 1888, a loja de chocolates La Bombonière foi inaugurada na rua Líbero Badaró por Alfred Richter.
Richter casou-se em 1900 com Alwine Sophia Sönksen, que herdou a loja depois da morte do marido. Como não quis continuar com o negócio, vendeu a La Bombonière para João Faulhammer em 1904.
Uma das filhas do empresário, Anna Sophia, casou-se com Augusto Sönksen, irmão de Alwine. Foi ele quem convenceu Alwine a voltar para o negócio, junto com outro irmão, Christian.
Os três compraram a empresa de Faulhammer em 1912 e deram a ela o nome de Sönksen. A fábrica e a sede ficavam num prédio no número 310 da Rua Vergueiro.
Em 1973 a Sönksen foi colocada à venda e passou para as mãos de um grupo de empresários que controlava também a doceria Ofner. Por volta da década de 80 a marca foi descontinuada pelos novos controladores.