A Exposição Nacional de 1908
e o primeiro reconhecimento de qualidade da Casa da Boia
Desde que fora “descoberto” pela Coroa Portuguesa, estabaleceu-se no Brasil uma relação de comércio que era exclusiva entre a colônia (Brasil) e a Metrópole (Portugal) que era a única forma comercial permitida à nova colônia portuguesa. Ou seja, apenas Portugal poderia fornecer produtos ao Brasil e este só poderia vender matéria-prima ou os poucos produtos manufaturados para Portugal.
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Foi assim por mais de 300 anos, enquanto vigorou o “Pacto Colonial”. Quem quisesse vender algo para o Brasil, tinha que passar necessariamente pela alfândega portuguesa e só depois de Portugal intermediar a negociação um produto poderia chegar à colônia. E, o inverso acontecia da mesma forma. Para vender a outros países, fazendeiros e produtores brasileiros tinham que, primeiro, vender a Portugal, que então revendia os produtos.
Tudo ia bem, e bem lucrativo (para Portugal, né?), até que um tal de Napoleão Bonaparte iniciou uma campanha de conquista de territórios na Europa, expandindo as fronteiras da França, no final do Século XVIII e início do Século XIX.
Com as tropas de Napoleão invadindo outras nações e provocando um desequilíbrio comercial em todo o território europeu a geopolítica e a economia estratificadas no imperialismo Português, Inglês, Francês e Espanhol, principalmente, foram sacudidas e com a necessidade de se criar uma nova ordem econômica.
Em 1808 Napoleão invade Portugal. Enquanto as tropas francesas entravam pela porta da frente, a família real portuguesa saía pela dos fundos fugida para sua mais importante colônia.
Assim, Dom João VI e a corte portuguesa rapidinho embarcaram em uma esquadra de naus portuguesa rumo ao Brasil. Mas, um detalhe, uma nação bastante “amiga” de Portugal, a Inglaterra, deu todo o apoio e escolta à esquadra portuguesa para que conseguissem sair da Europa sem ser atacada pelas tropas napoleônicas.
A comitiva com a família real portuguesa desembarcou na Bahia no dia 22 de janeiro de 1808 e os ingleses não demoraram a apresentar a conta do apoio à Portugal.
O país de Shakespeare enfrentava os bloqueios de seus portos comerciais com o restante dos portos europeus, envolvidos no conflito com Napoleão.
Assim, apenas seis dias após aportar na Bahia, Dom João VI promulga sua primeira carta régia (equivalente aos decretos atuais), justamente aquele que, a partir de 28 de janeiro de 1808, liberava comércio brasileiro com as nações amigas.
Não é preciso mais muitas linhas para dizer quem foi a nação “mais amiga” a ser beneficiada com o primeiro decreto do rei em terras brasileiras. O ouro das Minas Gerais continuaria a enriquecer nossos amigos ingleses, assim como nos 300 anos anteriores.
A expansão dos ciclos econômicos no Séc. XIX
Cem anos se passaram desde a abertura dos portos brasileiros. No decorrer do Séc. XVIII muita coisa aconteceu aqui no nosso Brasil, a independência, guerras no continente, a abolição da escravatura, a república e, principalmente um intenso crescimento econômico, primeiro com os ciclos da borracha e do café e finalmente o ciclo industrial.
Neste período, em 1895, chega ao Brasil o imigrante sírio Rizkallah Jorge Tahan, que estabelece em São Paulo, no ano de 1898, a Rizkallah Jorge e Cia, possivelmente a primeira empresa a produzir artefatos de cobre na capital.
Como já contamos antes em diversos posts, Rizkallah prosperou, sua empresa se tornou uma referência na capital paulista e também para o Brasil.
O final do Século XIX e início do Século XX foram marcados pelo surgimento de um ciclo industrial urbano, uma nova fase da economia do país, até então totalmente dependente dos ciclos da agricultura.
Com o objetivo de mostrar ao brasileiro e a outras nações do mundo o progresso que o país tivera no último século, o governo brasileiro decide organizar uma exposição que reunisse a produção agrícola, científica e industrial da nação.
Comemorar o centenário da abertura dos portos foi um “link” perfeito para justificar a intenção do governo e assim começou a se preparar a “Exposição Nacional de 1908” no Rio de Janeiro, então capital da República.
A exposição impressionante de 1908 e sua inspiração nas exposições universais
Quando a gente fala em exposição nacional, talvez nos venha à mente, as feiras de negócios que todos nós já tenhamos participado em algum local de exposição, como o Anhembi, o Center Norte, o São Paulo Expo, enfim, estes locais que abrigam exposições e feiras.
Mas, nada disso se compara ao que foi a Exposição Nacional de 1908, e ao que eram as exposições mundiais à época.
A Exposição foi até então a maior celebração do comércio e desenvolvimento industrial que exibiu um “inventário” do Brasil através dos produtos industriais, agrícolas, pastoris e artísticos.
Para cada uma destas áreas do desenvolvimento foi construída uma edificação que, não à toa, levou o nome de “palácio” pois suas dimensões, arquitetura e luxo faziam jus ao nome.
A exposição comportou o Palácio da Indústria, o Palácio dos Estados, o Pavilhão do Distrito Federal e os pavilhões de São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Santa Catarina.
Também mostrou a modernização dos novos serviços públicos municipais e federais, entre eles o Pavilhão do Corpo de Bombeiros, o Pavilhão dos Telégrafos e Correios, o Jardim Botânico, o Pavilhão do Café e Cacau e a Inspetoria de Matas e Jardins.
O único país estrangeiro participante foi Portugal, que construiu o Palácio Manuelino e um segundo pavilhão menor chamado Anexo Belas Artes.
A exposição aconteceu na região da Urca (Praia Vermelha), no Rio de Janeiro, de de 11 de agosto a 15 novembro de 1908.
Após o encerramento da Exposição, todos os prédios foram demolidos, com exceção do Palácio dos Estados e do Pavilhão das Máquinas.
A Exposição Nacional de 1908 foi inspirada nas grandes exposições mundiais. Estes eventos eram grandes espaços educativos onde as massas urbanas aprenderam a olhar, comparar e conhecer países e culturas baseados em construções, pavilhões e palácios, efêmeros (feitos apenas para o período da exposição).
Em 1851, em Londres, a indústria privada organizou a primeira Exposição Universal como uma grande feira com pavilhões e milhares de estandes que mostraram atividades manufatureiras, industriais e comerciais de vários países. O ineditismo da mostra e a monumentalidade do prédio temporário feito de ferro, madeira e vidro, que ficou conhecido como Palácio de Cristal, – espaço e símbolo de um sistema industrial – atraiu milhões de visitantes.
Em Paris, em 1855, a Exposição Universal teve dimensões novas: foi organizada pelo Estado e, além do Palácio da Indústria e da Galeria das Máquinas, foi construído um pavilhão especializado para abrigar um Salão de Belas Artes com parte das obras vindas do Museu do Louvre. O Salão influenciou a abertura de várias escolas de desenho com o intuito de desenvolver a capacidade técnica dos artesãos e artistas para ampliar a oferta de objetos artesanais e manufaturados.
O Pavilhão de São Paulo
O edifício do Pavilhão de São Paulo foi premiado no Concurso de Pavilhões promovido pelo Jornal do Comércio junto ao público. Era o maior e mais luxuoso pavilhão com 1.500 m² de área e foi projetado por Ramos de Azevedo e Ricardo Severo e executado pelo arquiteto Domiziano Rossi. Ele possuía uma base octogonal com duas entradas principais e, no centro, existia uma grande cúpula de 35 m de altura, encimada por um holofote que iluminava os vidros opalinos da construção. Exibia uma decoração opulenta com esculturas, relevos e doze cúpulas.
Apresentava salas destinadas às festas, conferências, recepção às autoridades e exposições de produtos e também uma sala que exibia um grande panorama da cidade de São Paulo feito pelo fotógrafo Valério Vieira, com onze metros de extensão.
Os produtos de São Paulo eram tão amplos e diversificados que foram usadas alas em dois andares do Palácio dos Estados, com estandes e quiosques que exibiram, além da produção agrícola, tecidos, maquinário, couro, cerâmica e desenhos arquitetônicos.
A Casa da Boia conquista seu primeiro grande prêmio na exposição
Já conceituada em sua área de atuação, a Casa da Boia, (Rizkallah Jorge e Cia) foi uma das empresas convidadas a integrar o Pavilhão de São Paulo na Exposição Nacional de 1808.
Rizkallah Jorge levou para a exposição aquilo que de melhor produzia em suas oficinas na Rua Florêncio de Abreu, em um mostruário de peças que foi reproduzido no ano de 2018 e hoje integra o acervo do Museu da Casa da Boia.
O mostruário, que focava na produção de material hidráulico, rendeu à empresa seu primeiro grande reconhecimento, o “Grande Prêmio” do Juri Superior da exposição.
Este diploma também faz parte do acervo da Casa da Boia. Está exposto em nosso museu junto com o prêmio conquistado em 1911, quando a empresa participou da “Exposição Internacional da Indústria e do Trabalho”, naquele ano, em Turim, Itália.
Não foram as únicas participações da Casa da Boia em exposições e nem os únicos reconhecimentos que a empresa viria a ter em seus quase 127 anos de atividades, mas, vale lembrar que o diploma da Exposição Nacional de 1908 tem especial significado para a empresa.
Afinal, naquele ano, a Casa da Boia mal havia completado dez anos de fundação e mesmo neste período curto de sua história já mostrava que a qualidade de seus produtos, que deram fama à empresa, teriam reconhecimento não apenas dos clientes, mas das entidades e juris técnicos das exposições que participara e ainda participaria.
Fontes:
https://brasilianafotografica.bn.gov.br/?p=11621
https://atom-mhn.museus.gov.br/index.php/exposicao-nacional-de-1908-no-rio-de-janeiro-3
Fotos da exposição: Augusto Malta. Acervo Museu da República.